domingo, 19 de abril de 2009

O Louco

Perguntais-me como me tornei louco.
Aconteceu assim:

Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido,
despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas -
as sete máscaras que eu havia confeccionado e usado em sete vidas -
e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando:

"Ladrões, ladrões, malditos ladrões!"

Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.
E quando cheguei à praça do mercado, um garoto trepado no telhado de uma casa gritou: "É um louco!"
Olhei para cima, para vê-lo. O sol beijou pela primeira vez minha face nua.
Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua,
e minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais minhas máscaras.
E, como num transe, gritei:

"Benditos, benditos os ladrões que roubaram minhas máscaras!"

Assim me tornei louco.
E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura:
a liberdade da solidão e a segurança de não ser compreendido,
pois aquele que nos compreende escraviza alguma coisa em nós.


3 comentários:

  1. O centro é tão insípido... E quando exista, por seus tentáculos, toque as bordas de tudo que contém a segurança da incompreenção e aquela solidão recolhida em sua liberdade de existir, porque tudo o que existe se transformará para desaparecer e ressurgir... Loucura é querer que a vida nos toque, em nós guardado o medo da dor, do torpor... Loucura é se guardar num escuro insípido.

    Beijos, minha linda!

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  2. Os Loucos

    Há vários tipos de louco.

    O hitleriano, que barafusta.
    O solícito, que dirige o trânsito.
    O maníaco fala-só.

    O idiota que se baba,
    explicado pelo psiquiatra gago.
    O legatário de outros,
    o que nos governa.

    O depressivo que salva
    o mundo. Aqueles que o destroem.

    E há sempre um
    (o mais intratável) que não desiste
    e escreve versos.

    Não gosto destes loucos.
    (Torturados pela escuridão, pela morte?)
    Gosto desta velha senhora
    que ri, manso, pela rua, de felicidade.

    António Osório, in 'A Ignorância da Morte'

    Pois bem, minha sócia querida. Cada qual com sua loucura, afinal todos nós precisamos deste "lugar" guardados em nós que se chama: Loucura, onde por vzs nos refugiamos.

    Beijos

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  3. Na loucura reside a essência da verdade!

    Beijos

    Arthe

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